O teu olhar atordoa-me.
És mestre de desconcertos na minha vida. Baralhaste e voltaste a dar.
Banal de inicio, em palavras soltas e sofregos de alma, fui-me despindo sem querer. Os silencios falados envolviam-me cada passo, ouvia falar de mim.
Os sentidos calavam a voz da razão, guerreiros da paz e dos silencios, adormeciamos aquecidos pela força de lugares comuns e pensamentos contrarios. Como se toda a vida se refletisse em ti e as tuas palavras fossem um espelho de mim. Contigo, ergui as minhas espadas e tornei-te o meu lugar querido.
Viajamos aqui, percorremos vidas em conjunto, transformamos em voz os silencios e calamo-nos em gritos de razão.
Vi-te sol e inimigo. Vi um mar revolto em que me quis perder e não voltar. Vi a chegada à partida, vi a caminhada sem esforço, vi o som de me deixar viver.
Guerreamo-nos em silencio, as nossas caras ferveram no toque dos dedos que teimavam em dizer. Ousamos querer muito mais do que o nosso olhar alcançava.
Desassossegaste-me e zangaste-te comigo, remexeste-me a convicção deste ser julgado anonimo e sem expressão. Despiste-me de outra ilusão, rasgaste a razão, fizeste-me mergulhar nesse mar revolto em dias de suposta calmaria.
Na tela que pintamos, dançavam corpos àvidos de vida e apaziguados de solidão, vivi uma vida contigo, antes mesmo de te conhecer. Foi tanto este meu querer que me atrevi a querer não ter. A aspirar cada pedaço do teu olhar, a ler a linguagem da tua calma e a força do teu querer.
Fomos grandes ao ponto de crescermos em cada passo silencioso, em que os sons e as cores se tornavam iguais. Ouço-te antes de falares, quis-te sem te ter, és meu sem o seres. És mar salgado e infinito que tomou agora o seu lugar.
És hoje a calmaria em dias de tempestade, és a certeza do sonho, a convicção das vontades e a força das verdades. És amargo de boca, planicie temperada, conteudo incompleto, metade do meu todo.
Foi grande esta caminhada impensada e orquestrada por madrugadas sentidas e despidas das presas das analogias e vontades. Nesta clareira iluminada, o abraço prolongou-se até aqui, enchi-te de mim para sempre sabedora de não teres fim.
Ensinaste-me o meu ser.
Aturas-te em mim.
És cada vez mais um mar sem horizonte definido. Meu amigo de verdade. Minha imagem por decifrar.
Hoje estás dentro de mim, desassossegas-me com o teu olhar do mesmo mar, demos as mãos em silencio, calamos a tempestade e adormecemos de mãos dadas. Saltamos as reservas do caminho e saboreamos o vento de cada momento, feito de tudo e de nada.
Estarei sempre no teu caminho, de lenço estendido, para além do silencio da estrada, feito do meu olhar de menina resgatada das feridas e dos contos inventados.
És grande meu amigo, capaz de saltar desse estrada, só para te encontrares comigo!
quinta-feira, março 26, 2009
domingo, março 08, 2009
Jorge Palma
Tive quase a morrer mas consegui escapar.
Tenho visto muita gente a morrer devagar
O meu lugar é andar e o meu passo é correr
jorge palma
Tenho visto muita gente a morrer devagar
O meu lugar é andar e o meu passo é correr
jorge palma
sexta-feira, março 06, 2009
Historia Minha
Tinha umas jardineiras que adorava. Eram bonitas, ficavam-me bem no meu corpo recem descoberto de adolescente aspirante a mulher. Com elas, combinava sempre uma t-shirt branca e umas sapatilhas. O quadro ficava completo com o meu cabelo comprido e encaracolado, apanhado atras. Nunca demorava mais de 5 minutos a vestir-me.
O ano passara a correr. Orgulhava-me agora de um esforço quase desumano, pelo menos assim parecia nessa altura. Chegara ali, segurando nas minhas mãos pequenas o bastião da glória alcançada, horas, dias sem dormir com a cafeteira de café ao lado e mil livros espalhados à minha volta. Mas conseguira.
Sentia o orgulho com que o meu pai relatava aos amigos a obvia e expectavel entrada da filha na Universidade, como se nada mais fosse de esperar de mim. Eu assentia, convicta que ele continuava demasiadamente confiante.
Mal chegara, largara as malas e correra para a praia. Só parei mergulhada naquele mar quente e verde que conhecia desde pequena. A vida sorria-me. Lembro-me da leveza daqueles momentos cheios de sonhos feitos de certezas e vontades feitas de fantasias.
Amigos crescidos naquele ano, o calor merecido daquele lugar que me tinha visto crescer Verão após Verão. Sempre adorei esse lugar.
Foi nesse Verão que, segundo a história, me tornei mulher. Numa noite quente, escondidos no areal sem fim, perdidos em beijos que duravam até à falta de ar, secos de sal e molhados de mar, foi nesse momento que percebi que aquela sede não me deixaria mais, como uma necessidade vital que acabara de encontrar. Nessa noite percebi tambem que precisava de me despedir das jardineiras.
Era tão menina. Senti-me tão mulher.
Lembro-me de ser capaz de sentir, pensar, embebedar-me para sempre, o ser em que me envolvia fazia estremecer cada poro da minha pele, o corpo dançava ao som das suas mãos e uma dormencia de consciencia foi baixando em mim. Descobria a fonte da minha vida.
Alguem me dissera que a primeira vez não valia. Para mim foi uma vida de prazer.
Ainda menina sonhara com querer e decidir. Ali, naquele momento, a voz calou-se no mais fundo de mim, sentir era a descoberta de um mar de extase muito maior do que aquele outro que soava tão perto.
Era instintivo, sabia tudo, queria saber mais.
Nesse Verão de que me lembrei hoje não voltaria a mesma menina e nem me sentiria mais mulher. perdi-me nessa noite na descoberta de sentir prazer.
quinta-feira, março 05, 2009
Ninguém disse que os dias eram nossos
Ninguém disse que os dias eram nossos
Ninguém prometeu nada
Fui eu que julgei que podia arrancar sempre, mais uma madrugada.
E deixar-me devorar pelos sentidos,
E rasgar-me do mais fundo que ha em mim.
Emaranhar-me no mundo, e morrer por ser preciso,
Nunca por chegar ao fim.
Mafalda Veiga
Estranha
Sou mulher.
Como um jogo solitário, um puzzle dificil de encaixar, com peças soltas e outras no seu lugar.
Nas horas que passo sozinha, revejo episodios na minha vida e tento entender, sem adjectivar, apenas identificar esta e outras equações que identificam esta minha forma de ser.
Os corpos ganham forma à medida que a minha procura de razoes vai adicionando sonhos e vivencias a este quadro.
Cresci com a estranha sensação que não pertencia aqui, que em meu redor as gentes pareciam saber sempre a direcção a seguir. Eu não. Glamorizava sonhos possiveis, imaginava viagens necessárias, nunca estava aqui, desenhei os contornos dos homens que amaria; e nada se refletia na minha imagem em frente ao espelho.
Sempre vi uma estranha em frente ao espelho.
Decadas mais tarde, nada mudou.
Sou me familiarmente estranha.
Subscrever:
Mensagens (Atom)