sexta-feira, fevereiro 26, 2010

Sinto falta de me encontrar, de agua, de mar e vento na cara, sinto saudade de me perder nas estradas desconhecidas que sempre foram dar a sitios mais bonitos. Sinto falta de não saber onde estou, de me atascar e não ver nada em volta. Sinto falta do Guincho e da Serra que à noite espreita a Atalaia, sinto saudades deste espaço que herdei, que sempre me fez andar, sem destino e sem companhia que ouça a mesma musica que eu ouço da vida.
Sinto falta de mim e, amanhã, ao romper do dia, vou-me perder numa estrada qualquer, vou levar os meus amigos e procurar o Tejo onde ele se esconde, vou descobrir uma foz calma e viva e desaguar as minhas mãos molhadas nas pedras do fundo, atascar os pés descalços e aguardar que chova.
O semblante franzino dificultava a minha mente de se situar ali, vagueava por cada sitio onde me parece ter deixado um pedaço de mim, não que o tenha perdido, simplesmente ele pertencia a cada lugar onde fui feliz, onde os meus olhos brilharam, e a minha face ferveu. Breves momentos do tempo de uma vida, cheios do nada que despi, que usei a preceito no resto do caminho que mal me viu.
É mais que saudade, é uma dor evidente, é uma lagrima assente na reticencia de mim. É mais que vontade, porque em cada lugar, já não cabe a minha presença, é mais que a vivencia musicada ou um mar desaguado, é o que brota crescente da minha alma acordada, presa numa enxurrada que eu não soube abraçar. Não é um pronome qualquer, não é o sonho de ter, ou o medo de não ser, é como um quadro sublime, a descoberta de uma arte divina e de um sentir maior que o mundo e depois, num segundo, desistir, destruir, transformar num esboço a carvão, a ideia mais bonita e sentida que fui capa de esculpir.
A sala definitivamente branca, pequena demais, os meus joelhos não tremem, ensaio o que ofereço, o suficiente para me manter anonima onde sei não estar.
Chama-me o vento lá fora, chama-me a noite revolta, o que era a sensação de conforto é agora apenas desordem. Ouço-me mais que alguma vez fui capaz.
Queria escrever, sentei-me aqui para escrever.

terça-feira, fevereiro 23, 2010

Sou só eu que ando enjoada com o tempo que se gasta a jogar ao anel e apanhada, com discussões idiotas sobre o que menos importa?
Alguém está preocupado com o Deficit Publico e com a fuga de capitais? Alguém está ao volante deste barco ou andamos entretidos a treinar manobras de diversão?
Liberdade de expressão? "O PM tem cara de parvo e não presta e o melhor que ele fazia era ir desfilar para o Galiano", já disse, eu tenho! Que parvoice é esta?
Alguém questiona a banhada que levamos das farmacêuticas? Alguém faz contas de redução? Alguém me explica os indicadores económicos e as medidas que se pretendem? O caso "Face Oculta", "O Polvo", "A Casa Pia", " O Apito", o que é isto? Um rato parido, mais um?
E ainda nos permitimos desdenhar o Cavaco que se abstém de comentar esta fantochada encenada para encher o tempo entre o Sporting e o Benfica...
E a ETA? Nunca cá esteve, como não deixou de estar, ou já nos esquecemos? O que eu sei, e não se fala, é que industrias extrativas estão paradas e vergadas a um medo que não lhes é devido, o que sinto é o estigma de criminosos, os que trabalham com substancias que talham as pedras lisas e polidas que ninguém deixa de querer.
759 milhoes de euros a mais de deficit em Janeiro, desemprego, desmotivação, Taxa de Juro, alguém está a olhar para isso? E a Opa? E as fugas de dinheiro? Quero lá saber das de informação...
E porquê? Porque me dá voltas ao estomago, ouvir o palavreado catedrático e despropositado, de muita parra e pouca uva, nos comunicados, nas entrevistas, palavras inventadas no momento mas que soam a convictas e no fim, no gabinetezinho, ao telefone, falam uns com os outros como na tasca, gozam com a minha cara, entretidos com a brincadeira do rei manda.
Vão para o raio que os parta!

segunda-feira, fevereiro 22, 2010


A escrita é a minha primeira morada de silêncio
a segunda irrompe do corpo movendo-se por trás das palavras
extensas praias vazias onde o mar nunca chegou
deserto onde os dedos murmuram o último crime
escrever-te continuamente... areia e mais areia
construindo no sangue altíssimas paredes de nada



esta paixão pelos objectos que guardaste
esta pele-memória exalando não sei que desastre
a língua de limos



espalhávamos sementes de cicuta pelo nevoeiro dos sonhos
as manhãs chegavam como um gemido estelar
e eu perseguia teu rasto de esperma à beira-mar



outros corpos de salsugem atravessam o silêncio
desta morada erguida na precária saliva do crepúsculo

Al Berto - "O Medo"

domingo, fevereiro 21, 2010

Memória de um sonho

O Duomo adormece o poente, numa palete de cores salpicada pelo voo dos pombos na praça. Ouvem-se tambores e saltimbancos, e os estudantes recolhem os rasgos nas telas iluminadas pelo conhecimento. Dos claustros, ecoam canticos e silencios guardados, livros dançam nas mentes de quem passa, a vida refaz-se nos tons do ocaso. A ponte de Vecchio fervilha nos contornos sublimes da urbe e da agua corrente.

O meu pedido pequeno, na boca do javali, era uma prece sussurrada, das mãos quentes de ti. Sublimados os passos, dançamos no largo sem destino, como sempre antevimos no olhar. Brilhamos de anonimos, de sorrisos que soltamos à Historia Universal que Firenze regista.
O peito respira, corpos renascidos da presença, aclamadas memórias esquecidas, não sabemos o que nos trouxe aqui, mas foi aqui que sempre aspiramos olharmos, foi aqui que dançamos nas noites despidas de voz.
Estão vazias as tuas mãos, assim como as minhas, tocam-se, apertam-se num compasso de vida que durou três luas e os gritos da desordem e do tempo que agora aclama.


Guardamos no fundo dos olhos, de onde se avista a alma. Vivemos, chegamos e partimos, sempre estivemos aqui e em todos os lugares que nos moveram e geraram este sopro que o mundo oferece a quem ama.
Somos fantoches, amantes, sublimes pontos nesta cidade encantada.
Aqui ou noutro lugar. Ofereço-me a ti, no que sempre te pertenceu, julguei-me dona de mim quando a minha alma apenas me retorna para anunciar que sou eu, mas em ti!

Há muito tempo, sentada na praça, deslumbrada com a magnitude deste lugar, vi-te, sonhei que existias e que o meu caminho só faria sentido, na tua direcção... Onde me perdi? 

sábado, fevereiro 20, 2010



Sou, em grande parte, a mesma prosa que escrevo. [...] Tornei-me uma figura de livro, uma vida lida. O que sinto é (sem que eu queira) sentido para se escrever que se. sentiu. O que penso está logo em palavras, misturado com imagens que o desfazem, aberto em ritmos que são outra coisa qualquer. De tanto recompor-me destruí-me. De tanto pensar-me, sou já meus pensamentos mas não eu. Sondei-me e deixei cair a sonda; vivo a pensar se sou fundo ou não, sem outra sonda agora senão o olhar que me mostra, claro a'negro no espelho do poço alto, meu próprio rosto que me contempla contemplá-lo.

Fernando Pessoa "Livro do Desassossego" 1939

A voz da Terra


Edward Hopper


A voz da terra grita alto, chora e reclama a sobriedade da sua magnitude, lembra a ordem da criação, impõe a destruição e humildade. Fascinada pela dimensão, reconheço a pequenês que nos molda. A natureza fascina-me, rendo-me ao fogo dos sentidos, zangada a terra acorda, lava as obras, mata e grita. Grita ordem?
Não sei!
Deixo o perigo que me corre nas mãos, submissa à magnitude, deixo uma palavra a quem molda nas mãos rudes, a força, a desordem. Rendida, não tem explicação, explosão avassaladora, por nada ou por qualquer motivo que nunca entenderei.
Água, fogo, e a minha mente enganada, por isso não lhe creio, por isso aprendo que a voz dos sentidos é mais expressiva. 
Lamento as vidas, sinto a responsabilidade da força dos elementos que manuseio, do perigo. E fascina-me porém, a paixão da desordem que me ordena por fim. A equação é apenas o resto da divisão e a prova dos nove. Simulada, enganada, rendida, ouço apenas o que a minha alma me diz, sou tão pequena, afinal, sou grão de trigo por colher, leio um livro, bebo palavras, faço figas a esta margem convergente, são duras as minhas mãos. Lição mais crescente de vida.
Bebo agua salgada, o mar revolto transborda de palavras, de mão apontada diz, fala, e eu vejo os sinais como sinos ancestrais que me estremecem por dentro. Aprendo, aprendo mais, sinto os meus pés crescerem, falo alto, digo o que o meu corpo já mostra há tanto tempo, "disconforme" entre mim e a minha forma.
Conto as horas, uma a uma, badaladas tão bonitas!
Descubro a tela em branco que a meio da vida, arrisco esboçar, tremem as mãos, riscos sentidos, tempo, ordem, ao longe o horizonte explode em milhares de cores que mal conheço. A terra transpira de ensinamento. 

sábado, fevereiro 13, 2010

Slow but Speeding


Come and see
I swear by now I'm playing time against my troubles, oh
I'm coming slow but speeding
Do you wish a dance and while
I'm in the front
The play on time is won
But the difficulty is coming here
I will go in this way
And find my own way out
I won't tell you to be
But It's coming to much more
Me
Come down like ghosts come back
Reeling in you now
Oh, what if they came down crushing?
In a way I used to play for
all the loneliness that nobody
notices now
Oh, I'm begging slow
I'm coming here
Only waiting
I wanted to stay,
I wanted to play,
I wanted to love you
I'm only this far
And only tomorrow leads the way
I'm coming waltzing back and
moving into your head
Please, I wouldn't pass this by
Oh, I wouldn't take any more than...
What sort of man goes by...?
I will bring water
Why won't you ever be glad?
It melts into wonder
I came in praying for you
Why won't you run
into rain and pray?
Can a kiss splash all over you?
DMB - #41

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Acismo

O acismo das palavras, tornava-se bebida quente numa chávena que pedia naqueles dias em que o meu entendimento era um mar de calmaria e tormento, era cegueira causada e uma voz imprecisa de razões incalculadas , na esperança de tradução.
Era a vontade que me faltava entender..

quarta-feira, fevereiro 10, 2010


Destruo, 
Obra de alcance tremendo.
Destruo-me, apenas.
Menos o que por dentro
me habita.

Obra vergonhosa a minha
Vulgar diria
Sou vilã, puta fina
Antes ladra e concubina
Carapaça somente
de alma demente e perdida.

Amiga não
Sou traição e mentira
Sou morte sem vida
Sou mãe sem saber
Gerei mar gélido
maré vazia
Fui má, mais que rainha

Sou afinal poeira seca
levantada de uma só pegada
Nem passado nem presente
Fui maré negra que passa

Fui face cortada
face oculta
Fui a versão de culpa
Fui corpo somente
Fui visita, visitada
Ouvida de nada
que palavras fizeram colheita
da mentira calculada

Sou fantoche
Fui palhaça
Carapaça infundada
não sou mais que vaca de estrada
com rosto de mulher vaga.

Sou o que resta afinal
Restolho de desventura
Cinza clara, nova lua
Sou o veneno que cura
Cobra arisca, 
gargalhada
verme de albergue na estrada
ao som de qualquer vento que passe.

Sou mentira
Nada mais que isso

terça-feira, fevereiro 09, 2010




Esgotei as palavras de sentido, se soubesse pintar seria apenas um vulto desenhado  num areal despido, de mãos demasiadamente pequenas, cara escorrida de olhar perdido, da soma do nada, juntados pedaços sublimes e pertences poucos.
Deixo-me agora, não me conheço, não me encontro.

Peço só à minha mente que me deixe agora, enquanto me  procuro, desfeita.
Tremem-me as mãos, treme-me a voz, a minha mente não me conhece, 
e eu conheço cada veneno que bebo, um atrás do outro, consciente, demente.
Até um dia, o que quer que eu seja.

Cá dentro, chora um passo primeiro, um segundo pioneiro, de respeito, de coerência, e sabedoria de me dizer que não sabia, julgando não dizer. Saem-me palavras em silabas, despidas de significado, respiradas apenas, do desespero de me ir dizendo tão baixinho, que cá dentro, mora ainda, a verdade de um caminho que só eu percorri. 
E se um dia, as palavras me saírem, iguais ao sentido com que o meu corpo as verteu, se a agua que me corre, servir, para lavar de mim a herança plena das minhas mãos, estarei aqui, feita de todos os bocadinhos de mim, para as deixar.
Agora, quero só silencio, purgar-me desta penumbra erguida, desta voz que não me fala, deste sorriso inventado, de cada pegada, e da guerra que me destroi por dentro.