sábado, fevereiro 20, 2010



Sou, em grande parte, a mesma prosa que escrevo. [...] Tornei-me uma figura de livro, uma vida lida. O que sinto é (sem que eu queira) sentido para se escrever que se. sentiu. O que penso está logo em palavras, misturado com imagens que o desfazem, aberto em ritmos que são outra coisa qualquer. De tanto recompor-me destruí-me. De tanto pensar-me, sou já meus pensamentos mas não eu. Sondei-me e deixei cair a sonda; vivo a pensar se sou fundo ou não, sem outra sonda agora senão o olhar que me mostra, claro a'negro no espelho do poço alto, meu próprio rosto que me contempla contemplá-lo.

Fernando Pessoa "Livro do Desassossego" 1939

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